quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

Rezas e benzeduras - por Cristiano da Silva Barbosa


Entre os males que afligem os homens, a doença é a mais frequente. A cura, com base na força miraculosa, em poderes sobrenaturais, sempre foi uma constante em sua existência, através dos tempos e entre diferentes partes do mundo. A história também mostra que o homem começou a procurar meios de se livrar das doenças, criando uma medicina popular. 

Em lugares totalmente desprovidos, muitas vezes de recursos e conforto, os gaúchos aprendem a se “defender” e usar tudo o que a natureza oferece. Uma cultura passada de geração em geração e que, a cada dia, com a “modernidade”, vem desaparecendo. Gaúchos muitas vezes brutos e ao mesmo tempo afetuosos, muitos analfabetos. Acreditavam no poder das rezas e benzeduras e ainda mais, nas pessoas, na firmeza de um olhar ou um aperto de mão. Pode-se afirmar que nem tudo se resolvia com as rezas, mas constata-se que curaram muita gente. 

     No Rio Grande do Sul, é a benzedeira que tem todos os métodos não ortodoxos no exercício da cura e, afinal, o que todos querem é estar bem. 

     Existem diferentes formas de reza e benzeduras para cada situação. Essas são acompanhadas de uma oração bem simples e um ritual repetitivo, dependendo muito da fé de quem benze e de quem busca a cura, podendo ser à distância, mas sempre acompanhada de uma peça de roupa a quem se direciona a oração. Como se disse, as palavras não são mais importantes que a fé que a pessoa tem em Deus. 

     Nas benzeduras não existe súplica ou pedido, a reza é feita apoiada na força da palavra, ficando evidente que, ao ser pronunciado, o mal se afasta naturalmente. 

     Como as rezas são passadas oralmente, muitas palavras são deturpadas, mas a benzedura segue o rito fielmente. É muito difícil obter uma reza, porque essa é realizada com rapidez e em voz sempre baixa, pois, se revelada, a benzedura perde o ”poder de cura.” 

     São fontes intermináveis de energia, desejos de fazer o bem, possuem um olhar magnetizante, aquela candura que nos passa sensações muito boas. Elas mobilizam poderes, unindo a vontade de curar, de fazer o bem, com obediência e concentração, transformando e dissolvendo as energias negativas. 

     Não existe “profissão benzedor” e em sua maioria, não cobram. É comum às pessoas que se curaram, sentirem-se gratificadas e retribuirem espontaneamente em forma de dinheiro, alimentos variados, que vão desde produtos agrícolas aos de feitura caseira. 

   

     A religiosidade, que essas pessoas apresentam, diante dessas manifestações, vem a se constituir em verdadeiros temas folclóricos que servem para mostrar todo reconhecimento e respeito a Deus. A inteligência natural, da gente da terra, supria a incultura com sua espontaneidade no trato da matéria espiritual.

      Não se encontrou nenhum benzedor que se propunha a ter pensamentos negativos, no sentido de prejudicar alguém ou causar atraso na vida de uma determinada pessoa, ou mesmo orações com conteúdos maléficos. Todo o benzedor tem pia credulidade em Deus e escolhe para si um santo católico devocionista. Por isso, este é sempre bem recebido na comunidade em que vive, com afabilidade e simpatia. É uma pessoa simples, muitas vezes pouco letrada, que confia no seu poder de transmitir o bem aos outros. 

Fragmento do livro Ensaios Sobre o Povo Gaúcho.
Cristiano da Silva Barbosa





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